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Humberto de Bettencourt

Faleceu  a 23 de Dezembro de 1963 na sua residência em Ponta Delgada, o professor, jornalista, ensaísta e poeta  Humberto Bettencourt Medeiros e Câmara, com 88 anos de idade, viúvo de Cristina de Albuquerque Medeiros e Câmara.

Nasceu em Ponta Delgada a 31 de Janeiro de 1875, Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra,  onde foi colega e amigo de Afonso Lopes Vieira e de Eugénio de Castro. Já na sua geração de Coimbra, Humberto Bettencourt distinguira-se como poeta de invulgar merecimento e de inspiração brotando em genuínos moldes parnasianos, revelando sempre que lhe apetecia uma inconfundível veia satírica.

Regressando a Ponta Delgada, desistiu da advocacia seguindo carreira como professor do ensino secundário no Liceu durante algumas décadas e como director e professor da Escola do Magistério Primário, tendo escrito para festas escolares autos do Natal e de carácter popular marcados como do melhor. Também como jornalista afirmou invulgares qualidades, tendo dirigido o jornal «O Correio Micaelense»  nos últimos anos da Monarquia (1908-1910).

Ao serviço do concelho de Ponta Delgada, foi comissário de polícia, um dos sócios fundadores e o primeiro presidente do Instituto Cultural, Vice-Presidente da Câmara Municipal e administrador do concelho, revelando sempre bom senso e dedicação regional. Foi também, durante muitos anos, chefe de secretaria na Santa Casa da Misericórdia e fez parte Comissão Editora da publicação das «Saudades da Terra», em 1922, juntamente com Rodrigo Rodrigues, Manuel Monteiro Velho Arruda, Luís Bernardo Leite de Athayde, João de Simas e Alexandre de Sousa Alvin. É recordado desde 2005 na toponímia da cidade Ponta Delgada.

A sua obra cingiu-se unicamente à publicação do «Auto de Saudação», por ocasião da visita dos monarcas portugueses aos Açores, e só em 1955 é que o Instituto Cultural de Ponta Delgada editou alguns dos seus poemas para o volume «A Ilha Nova e outras rimas esparsas»,  que constituiu para muitos críticos literários uma verdadeira revelação. Para além destes, publicou vários versos, prosas e artigos de investigação na Revista Insulana e na imprensa periódica local e nacional.

 

O funeral

O seu funeral realizou-se às 16 horas do dia 24 de Dezembro, da sua residência na Rua da Alegria para o cemitério de São Joaquim. Presidiu ao funeral o Reverendo Vigário de São José, e usou da palavra, pelo Liceu, Escola do Magistério Primário e Instituto Cultural, o Dr. João Anglin:

“Meus Senhores

Algumas palavras, ainda que singelas, me cumpre dizer em homenagem a este saudoso amigo e antigo mestre cujo cadáver viemos hoje acompanhar à derradeira morada.

O Dr. Humberto de Bettencourt de Medeiros e Câmara, com cuja estima e amizade por largos anos muito me honrei, foi figura marcante da intelectualidade açoriana, no jornalismo, na poesia e no professorado, onde ocupou posições de relevo.

Antigo professor do Liceu de Ponta Delgada, conquistou as simpatias de numerosas gerações de rapazes que o tiveram como mestre preclaro e sabedor, em especial nas línguas latina e portuguesa, a última das quais manejava com elegância e notável saber. Também durante longo período dirigiu com acerto e proficiência a antiga escola normal desta cidade, de preparação profissionalismo de professores primários, que ainda falam com admiração do seu saudoso director, que em cada um deles soube criar um amigo.

Companheiro e amigo de Afonso Lopes Vieira e Eugénio de Castro nos seus tempos de Coimbra, onde cursou a faculdade de Direito, o Dr. Humberto de Bettencourt, concluídos os estudos jurídicos, volveu à terra natal e nela se fixou até ao fim da vida, exercendo funções destacantes no meio social de Ponta Delgada, em várias sectores de actividade administrativa e mental.

Ao redigir, um pouco apressadamente, estas linhas de preito à sua memória, evoco a sua figura de jornalista distinto, que durante alguns anos esteve à frente do diário e Correio Micaelense, quotidiano que marcou época entres as publicações periódicas de S. Miguel pela sua elegância literária e aprumadas atitudes no campo da política, bem agitada no nosso país nos últimos anos do regime monárquico, que este saudoso amigo serviu com lealdade e sacrifício.

Como poeta lírico, Humberto de Bettencourt deixa nome solidamente firmado por uma produção literária pequena em quantidade mas do melhor quilate pela beleza da forma, pela sensibilidade requintada e pela bondade que era uma das características do seu espírito e que imprime aos seus formosos versos um cunho de encanto e sedução.

Foi o primeiro presidente do Instituto Cultural de Ponta Delgada, que ainda não há muito prestou justiça à sua personalidade, promovendo e custeando, em parte, a edição da colectânea de poemas «A Ilha Nova e outras rimas esparsas», conseguindo por esta forma, até certo ponto, salvar do esquecimento algumas pequenas obras primas da literatura poética portuguesa, que doutra forma correriam o risco de se sumirem no pó das bibliotecas.

Com isto praticou o Instituto acção meritória pois tornou mais acessível ao público que aprecia a beleza da arte literária as produções de um espírito notavelmente favorecido pelas musas.

Como atrás disse, o Dr. Humberto Bettencourt honrou-me por muitos anos com a sua amizade, que era límpida, e a sua lealdade, que era sólida. Por isso, em meu nome pessoal e em nome do Liceu desta cidade, onde este ilustre morto exerceu por largos períodos o professorado e ainda em nome do Instituto Cultural, de que ele foi, como deixei dito, o primeiro presidente, me apressei a redigir estas breves linhas, para dizer no cemitério onde as suas cinzas permanecerão para sempre.

Humberto Bettencourt, a par de prosador de elevados méritos e de poeta de superior sensibilidade, era um homem de coração e um amigo com quem se podia contar.

O mesmo dirão, estou certo, quantos aqui vieram, nesta tarde brumosa de invernia prestar o preito da homenagem devida à sua saudosa memória.”